O RELATO DE ALABAD

O RELATO DE ALABAD

Apesar das dificuldades que todos vivemos em função da pandemia do COVID 19, a ESTE – Estação Teatral arrancou no mês de Abril com a sua 39ª criação. Como facilmente se pode entender, o início deste trabalho, a 15 de Abril, significou fazer encontros cujo contacto social só pôde ser efectivado à distância. 


Em tempos como estes, a ESTE vai tacteando a cada dia as suas possibilidades reais e o desenvolvimento do contexto global de pandemia que vivemos e que atinge todos os sectores da sociedade. Ainda assim, excluir a presença social num mesmo tempo-espaço a uma companhia de teatro significa que esta só pode trabalhar com o virtual da vida e não com o da representação, pois é impossível tomar decisões sem se saber minimamente o dia de amanhã. 


“O Relato de Alabad” está, não obstante esta contingência, em desenvolvimento e preparado para tomar várias formas e caminhos, aceitando a realidade de cada dia; renovando, nestes tempos pós-modernos, a sua pertinência na perspectiva dessa observação do “outro”, na possibilidade de se considerar com atenção e respeito o “lado de lá” e, mais ainda, no contacto com a narrativa que, deveras, não se conhece. E é justamente este o território do teatro. No seu tempo verbal que é o condicional dado pelo “se”. Mais que conjectura, experiência emotiva e cognitiva dada pela imersão, o teatro significa o OUTRO. Sentir pelo outro para ajudar outro a sentir. 


Este novo projecto da ESTE resulta de um texto da autoria de Nuno Pino Custódio, estreado em 2002 no Teatro Meridional, interpretado pelo próprio e dirigido por Miguel Seabra. Dezoito anos depois, já com uma considerável carreira, esta obra a solo foi alvo de uma nova versão pelo autor (e agora encenador), actualizando a experiência acumulada e a própria evolução artística, sua e da companhia, de duas décadas. O actor convidado é Pedro Diogo, um colaborador “histórico” da ESTE e alguém que de forma estrutural interioriza a própria ideia de teatro desta pequena unidade de criação. Consigo, estará o guitarrista Pedro Rufino, que tocará alaúde, sendo o design de cena da responsabilidade de Patrícia Raposo, colaboradora desta estrutura desde 2018. 


O desenho de luz, como desde a sua fundação, caberá a Pedro Fino, estando Alexandre Barata na direcção de produção e Tiago Poiares na assistência de encenação.


Este texto para um trabalho a solo, dentro da perspectiva do que se define como Teatro Total, fala do ano de 1147 e da defesa de Lisboa contra portugueses e cruzados em trânsito para a Terra Santa (Segunda Cruzada). 


Partindo de relatos ocidentais, recria-se o ponto de vista do “lado de lá”, o dos muçulmanos, através da crónica de Alabad bin Muhammad Almançor, arqueiro e poeta. Fugido de Santarém (tomada de assalto pelos portugueses meses antes), Alabad e o seu irmão Youssef são acolhidos por um tio lisbonense, procurando aí recomeçar as suas vidas. Mas a esperança de uma existência feliz naquela cidade florescente e muito populosa em breve se transformará numa tormenta, quando os cristãos chegam às portas da cidade para conquistá-la (na perspectiva do defensor), para reclamá-la (na ideia do invasor). 


O cerco, que durará quatro longos meses, vai obrigar os habitantes de Lisboa a viverem ente o limite das suas forças, tendo a fome e a peste como pano de fundo, e o necessitarem de continuar a enveredar esforços para repelir o inimigo.